Estava fingindo que não era com ela. Preferia não criar a ilusão de que tudo aquilo era seu pra depois descobrir que não. Acontece que não era a primeira vez que reparava: por onde passava, a quantidade de estrelas em cima da sua cabeça era maior do que em cima da cabeça de outras pessoas e a lua estava mais próxima dela. Foi assim quando chegou à padaria logo depois do entardecer, quando chegou à casa dos avós para devorar aquele jantar suculento, quando saiu do bar com os amigos e entrou na conveniência pra matar a fome da madrugada. Em todos os lugares da cidadezinha, ela tinha a impressão de que seu cérebro estava grávido de estrelas e que o luar era seu parente. A sensação devia ser justificada por sua falta de grandes preocupações dos últimos dias? É que andava com a cabeça distante, flutuante, reticente e os neurônios se permitiam brincar com seus pensamentos, colocando-os de pernas para o ar e fazendo farra com eles. Para isso os humanos deram o nome de férias...
Aí voltou à realidade dos dias normais, nublados e trabalhosos de São Paulo, cheios de gorduras trans da comida congelada e do café de máquina, buzinas, falta de paciência e excesso de medo. Sentiu que aquela tranquilidade que fazia seus pensamentos brincarem se esvaiu dia a dia, conforme o telefone tocava ou seus dedos teclavam. E teve um aborto espontâneo daquela farra das estrelas e da lua em cima de sua cabeça.
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4 comentários:
Seu texto...... forte e quente...... e vivo...... como sempre!
Eu sempre dou um suspiro depois de ler os seus textos...
Ai, que lindo. E triste!
Adoro passar por aqui...
Bjs
Linda! (só pra vc saber que eu sempre passo por aqui)...
Beijosss
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