segunda-feira, 22 de agosto de 2011

desabafo bom.

Ei, chega mais. Deixa eu te contar que hoje sonhei com o dia em que nossos olhos se cruzaram pela primeira vez. Sua camisa verde, a impressora, o corredor, meu casaco cinza, o café ruim. E veja você: me peguei desenhando esse momento com os olhos fechados hoje. E deixa eu te contar que ainda me surpreende a forma como você virou o jogo. O jeito como nada sutilmente me enfeitiçou.
A vida ia bem. Estava decidida a caminhar sozinha um tempo, chutando as pedrinhas do caminho sozinha, comendo a batata do Mc sozinha, pensando no que fazer aos finais de semana sozinha, essas coisas. Foi quando você deu o golpe de misericórdia. Disse que era tudo ou nada. Cansara de bancar o meu refúgio de poucas (mas boas) horas. Tirou meu consentimento de te ligar a qualquer hora, te ver a qualquer hora, querer um beijo a qualquer hora. Encurralou meu coração, laçou minhas pernas que viviam bambas com seus beijos.
E, sem perceber, vi meu coração empalidecer. Passei a reparar no contorno das suas sombrancelhas, no formato dos seus lábios, no tamanho do seu amor por mim. Engoli o pedido de desculpas por toda a indecisão da minha vida e lhe tasquei um beijo que selou tudo: os chopes de convencimento, os presentes e cartas de amor, os emails gigantes falando sobre o céu, o amor, o nada.
Hoje, quero dividir minha batata do Mc com você, planejar minhas horas com você e sair de mãos dadas pelo mundo com você.
Ai que bom será se isso nunca acabar.




domingo, 21 de agosto de 2011

segunda-feira, 15 de agosto de 2011

amores modernos 1

Sentada na cafeteria, apenas flertava com seu café numa boa, sem segundas ou terceiras intenções. Folheava o livro sem muito interesse -- desde pequena tinha apreço por figuras. A verdade é que não sabia porque trabalhava com palavras, se preferia os desenhos. Gostava também de ficar inerte em um café qualquer, pensando em nada mais que no movimento de seus dedos folheando as páginas de um livro ou uma revista qualquer.
Foi quando ele entrou, apressado, com o pescoço enrolado em um cachecol em busca de um café. Pé a pé, olhos serelepes, chegou em sua mesa, removendo as luvas e instalando um belo sorriso colgate em seus lábios rosados do frio.
- Você é a Michelle?
Os olhos inertes se descuidaram da revista e o miraram. Percorreram seu adidas surrado, suas calças coloridas e a camisa monocolor. Chegou ao cachecol preto e alcançou seu olhar, que sorria fosforecentemente. Teve certa pena ao dizer:
- Não sou a Michelle... Desculpe?

A face do moço perdeu o brilho. Parece que Michelle era alguém importante. Mas alguma coisa lhe fez fixar o olhar na expressão do novo habitante da cafeteria.
- Ah, imagine. Não precisa se descupar, eu é que peço desculpa. Você aí, toda vidrada em alguma leitura interessante. É que esperava encontrá-la. Sabe, não a conheço. Quero dizer, falamos pela internet algumas vezes, sem parar. Sei que ela gosta de vermelho, usa mais vestidos do que calças, é alta, bonita, tem os cabelos ruivos para combinar com suas sardas. Combinamos um café tem algum tempo. Ela disse que viria. Mas que besteira a minha.

Seus cilios se movimentam, frenéticos. Quanta informação! E não é que ele esperava um encontro com a tal deusa das sardas?
- Sabe, você pode não ter percebido, mas não sou ruiva, nem tenho sardas. Seria uma forma de descobrir...

- Puxa, é mesmo.
- Bem, você ao menos sabe se ela se chama Michelle mesmo?

- Por que ela mentiria?

(Não parece óbvio?, ela pensou)
- Porque vocês se falam em uma tela? Qualquer pessoa pode ser Maria, Michelle, Rita, Joana... Não preciso estudar anos de teoria da comunicação para entender que, nesses tempos de internet, o meio é a mensagem.

- (silêncio)
- Ah, vamos lá. Ruiva, com sardas? Bonita, inteligente? Eu posso ser a Penelope Cruz, se eu quiser que uma pessoa do outro lado da tela acredite.
Ele se senta. Ela não espera que ele admita a besteira.
- Sabe o que seria real?

- Hum?
- Você saber qual é o número favorito dela no Mc Donalds. Ou ainda saber se ela pede suco ou refrigerante light junto com seu big mac ou cheddar. Saber dizer qual é o seu Poderoso Chefão favorito (1, 2 ou 3), se ela curte Miles Davis ou Zeca Pagodinho. Se é do tipo filme de terror ou comédia. Kaiser ou Skol. Essas coisas...

- É... Besteira tudo isso.

(pausa e considerações).

- Desculpe mesmo.

E ele se afasta. Cada louco, ela pensa. E, quando está prestes a mergulhar novamente em sua leitura de imagens, ele se reaproxima e diz:

- Bem, mas qual é seu número favorito no Mc?

Ela sorriu, como quando vê chuva e sol (casamento de espanhol), ao mesmo tempo, na volta do almoço. Sentiu uma fisgada no estômago, um frio na barriga. Ele gargalhou com as bochechas. Ela abandonou a revista e os dois engataram um papo sério sobre preferências. Pediram mais café.

De repente, a Michelle ficou para trás de um modo definitivo.

domingo, 14 de agosto de 2011

Tenho saudade do que não vivo com você todos os dias. Das ligações que não faço. Do meu coração ligado no seu. De você não enxergar meu sorriso quando eu estou feliz. De você não compartilhar das dúvidas que surgem no meu caminho (e são tantas!). De não poder te contar que o trabalho vai bem, obrigada, e que planejo coisas lindas para o meu futuro. É ruim saber que você não estará lá... ou vai?

Essa distância besta que a vida insiste em fazer existir me faz esquecer de coisas importantes. Seu rosto, por exemplo. Já não consigo mais visualizá-lo sem olhar uma foto nossa. Sua imagem naquele dia, no parque, rindo com a gente como há muito não fazia. Você me deixou dirigir seu carro novo, nos olhava com afeto, não tinha ninguém que poderia nos tirar a felicidade.

Estive pensando: você me ensinou poucas coisas na vida. Entre elas está a mania de ler jornal, gostando muito do cheiro e da sujeira da tinta nos dedos. Acho que, de início, eu nem gostava tanto como gosto hoje. Eu lia apenas porque era um momento só seu e eu queria fazer parte de alguma coisa sua, transformando-a em algo nosso. Você, ali, querendo mostrar que sabia tudo. Eu ouvindo, fingindo que acreditava.

Tinha medo da sua desatenção comigo e com minhas irmãs. Lembra quando você me matriculou na série errada? De quando esqueceu meu aniversário? Pois é. Eu tinha pavor de que você me esquecesse no colégio, depois do horário. Rezava umas dezenas de ave-marias durante a aula para mandar o medo embora. E ele só se afastava quando eu via o seu carro.

Pensando bem, poucas vezes você mostrou seu apreço por mim. Só hoje – depois de grande – é que sei e percebo. Uma delas foi quando você me viu beijando meu primeiro paquerinha. Tenho certeza de que você teve medo aquela noite. Medo de eu estar crescendo, medo de perder a mão na minha educação, medo de eu fazer escolhas erradas. Não sei se era amor, ou se era o simples medo de dar errado como pai. Tudo bem, pai, você nem imaginava que nada disso importaria no futuro...

Hoje eu tenho apenas um buraco no meu peito. É saudade, falta. Não é nada muito grande, pois eu fui preenchendo com pequenas coisas que ajudam a aplacar essa falta.

Mas eu tenho umas porções extras de esperanças...