domingo, 6 de julho de 2008

Natal com gostinho de felicidade

Postado no Natal passado...

Era a primeira vez que passava as festanças e exageros longe de lá. De um lado, a janela; do outro, a solidão. Longe de casa, do cheiro característico do quarto planejado. Assistia sempre que possível ao espetáculo da neve branquinha e pura que cai sem parar lá fora daquelas quatro paredes. O frio lhe perseguia desde o aeroporto, onde colocara meias e roupas extras, e até agora lhe congelava a espinha. O lugar era incauto, mas o trabalho era interessante. As pessoas também. Admitia que ali estava por própria vontade. Outra cultura, outro semblante no rosto das pessoas. Habituou-se à nova vida como uma criança que aprende a comer de garfo e faca para não decepcionar os pais à mesa. Ao chegar, anotou em sua memória todas as malandragens necessárias para sobreviver ao frio, à comida insalubre e aos pés congelando. Assim que começava um novo mês, partia até a biblioteca para reservar todos os horários disponíveis no computador. Se não tinha dinheiro para ouvir a voz de seus familiares sempre, ao menos podia senti-los virtualmente. Bem de longe, no meio dos livros e dicionários estrangeiros, podia se sentir um pouco em casa. Viva a tecnologia!! Acompanhada de seu chocolate quente e munida de olhos na janela (nevava demais), ficava a esperar o contato com aquele mundo que, agora, em tempos natalinos, parecia ainda mais longe. Sim, era Natal. O primeiro de seus 21 anos longe de suas origens. Fora bem recebida, mas nada como sua casa, seu canto. As luzes da árvore de enfeite refletiam na neve da escadaria lá fora e gostava de pensar que o gelo poderia ser vermelho, azul, verde e de todas as outras cores. Empenhou-se em lembrar como se reuniam – irmãs, tios, avós, mãe e até mesmo o ai (em outras saudosas épocas) – para preparar a árvore da família. Pensava no calor de sua terra e de sua gente. Até o enfeite era mais bonito. No derradeiro dia, saiu mais cedo para ligar para casa e ouvir vozes mais conhecidas. Antes, no entanto, o jantar. No refeitório, o cheiro da comida lhe lembrava tudo, menos o peru de natal assado com tanto carinho pela mãe ou o arroz temperado com guloseimas da avó. Fechou os olhos e, ao mastigar os alimentos sem tempero, tentava imaginar o sabor da Ceia de Natal em casa, todos reunidos, presentes, festa, sorrisos, aquela oração em volta da mesa, olhares furtivos e risonhos entre os primos menores. Eram apenas sete da noite ali, mas lá já era natal. Ainda de olhos cerrados, era como se tomasse parte à mesa com seus familiares e sentisse o gostinho da uva passa no arroz com curry, do pêssego à moda da casa e da sobremesa especial preparada pela tia. Misturava lembranças, cheiros, sons... Terminou de mastigar, limpou com um guardanapo o gosto de felicidade que saia de sua boca, reuniu sua força de vontade em uma tigela para mais tarde, sorriu sozinha como um bebê em seu berço. E voltou à rotina. Tinha resolvido nunca mais estar longe para aquelas festividades tipicamente “família”.

Um comentário:

Verena Ferreira disse...

Comentário de Maria Aparecida em 02 de janeiro de 2008:

"Esta saudade que aperta o peito, a dor da saudade que nos tira o ar, o vazio dificil de preencher..., Porém aprendemos até a exercitar o pensamento, fechando os olhos e deixando a imaginação buscar as lembranças boas, as pessoas queridas, os sorrisos, os sonhos deixados pra trás.
Isto é crescimento que nos torna forte, audacioso, gente...
Beijos"